A Lei de Cotas (12.711 de 2012) para ingresso nas instituições federais de educação superior e ensino técnico de nível médio seria avaliada dez anos depois de sua implementação. O fim dos 10 primeiros anos coincidiu com o governo Bolsonaro, que não levou adiante a discussão, de modo que o Projeto de Lei (PL 5384/2020) que avalia as cotas como positivas e amplia as cotas para quilombolas foi discutido agora, em 2023. Em primeiro lugar, as cotas são para alunos egressos de escolas públicas e estudantes com renda familiar inferior a 1,5 salários mínimos. Em seguida, abre-se para pretos, pardos e indígenas.
Meu chefe perguntou no grupo whats se alguém poderia acompanhá-lo ao Senado. Eu me dispus e fui conversar com ele. Ao lado dele estava um assessor instruindo-o acerca da matéria a ser discutida em audiência pública. Éramos três, então. Apesar de ser ali embaixo, fomos de táxi, já que o calor está alto e a umidade extremamente baixa. Chegando no Anexo 2 do Senado, o segurança informou que a audiência pública na CCJ estava lotada. Como Eliel Benites era palestrante, ele passou. Gabriel Zanatta insistiu que Eliel precisava de assessoria e permitiram a entrada de só um. Eu fiquei de fora.
Os dois ficaram do lado de dentro, perto da porta, acionando contatos e tentando me trazer pra dentro. Veio chegando uma fila de parentes. Ouvia-se o canto e os maracás. Pararam na porta, em silêncio. O segurança ficou tenso e com o rosto enrubescido, foi falar com a primeira da fila. Iam pra outra audiência, do outro lado do prédio.
Recebi comunicado de que eu podia entrar. A assessora do senador Paulo Paim tinha liberado a minha entrada. Chegando na sala, reparei que as mesas e cadeiras estavam predominantemente vazias. Depois do primeiro pronunciamento, o Senador Paim pediu aos seguranças que liberassem a entrada de quem quisesse participar da audiência pública (mas quem tinha sido barrado antes não foi chamado de volta). As portas da audiência pública se abriram (um pouco tarde) porque alguém as tinha fechado antes.
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Turbante e cocar |
O principal argumento era a discriminação maior ainda que o negro sofria dentro da instituição de ensino, porque a cor de sua pele denunciaria que era cotista (como se não houvesse também concorrência entre os cotistas e como se as notas e rendimentos escolares fossem mais baixos). Eu fiquei pensando como o indígena é específico em relação ao negro: além de ser fisicamente identificável, o indígena vem de um outro mundo. Nesse outro mundo, a língua é outra, a moradia, comida, tempo, cultura são outros. E cada povo é um povo, com sua língua, cultura e cosmologia.
A fala do Eliel Benites apontou para possíveis transformações da própria instituição de ensino ao acolher estudantes indígenas. E isso faz toda a diferença. É o "envolvimento" de que fala Sonia Guajajara, é reflorestar mentes. As portas não se abrem só para as pessoas diversas (do branco classe média), mas também para os seus modos de ser.